HOMENAGEM À RESISTÊNCIA ANTIFASCISTA
Amigos e Companheiros
Estamos aqui reunidos, por ocasião do décimo primeiro aniversário da Revolução dos Cravos, junto ao edifício que serviu de sede à pide no Porto, para prestar homenagem à Resistência Antifascista.
Lembramos, neste momento, os democratas que aqui estiveram presos; lembramos os companheiros que estiveram encarcerados em qualquer das prisões fascistas do nosso país; lembramos todos os antifascistas que foram deportados para o Campo de Concentração do Tarrafal; lembramos todos os que foram torturados pela pide; lembramos todos os que, nas prisões ou fora delas, perderam a vida para nós vivêssemos, perderam a vida na luta contra o fascismo.
Lembramos também aqueles Amigos que, ainda vivos ou já mortos, sempre lutaram pelas Liberdades Democráticas, pela elevação do nível de vida do Povo português, pela Independência Nacional e pela paz e Cooperação entre os Povos.
Uma homenagem à Resistência Antifascista portuguesa não pode deixar de lembrar a resistência nos Países que foram vítimas da agressão dos exércitos nazi-fascistas, não pode deixar de lembrar os que foram vítimas de guerras coloniais, assim como não pode deixar de lembrar os que ainda agora vivem em países dominados por forças fascistas, nem deixar de lembrar os que lutam contra a invasão do seu país por bandos fascistas, organizados e pagos pelo imperialismo.
Na verdade, onde quer que se encontre um resistente antifascista, - no Chile, ou na Turquia, ou na África do Sul, ou na Namíbia, ou em El Salvador, ou em Angola, ou em Moçambique – encontra-se, como sabemos, um participante na luta geral dos povos pela Liberdade e pela Paz.
Assim, uma homenagem à Resistência Antifascista Portuguesa inclui necessariamente uma palavra de respeito e admiração por aqueles que foram, no passado, vítimas de agressões fascistas e uma palavra de solidariedade militante com aqueles que, actualmente, em qualquer país do Mundo, resistem à agressão por parte de forças ao serviço do imperialismo.
Uma homenagem à resistência Antifascista Portuguesa não se faz apenas de recordações do passado, por mais emocionantes que tais recordações sejam – e são! Como antifascistas que somos, temos de procurar, na experiência do passado, alguma luz para a compreensão do presente e para renovar o nosso compromisso com o futuro.
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Permitam-me, queridos amigos, que lhes leia, aqui e agora, um documento histórico. Trata-se do compromisso com o futuro, assumido por um notável grupo de resistentes antifascistas, ex-prisioneiros do Campo de Concentração de Buchenwald, que os nazis inauguraram, em 1937, na Alemanha Oriental. Após a sua libertação pelo exército soviético há precisamente 40 anos, em Abril de 1945, os ex-prisioneiros de Buchenwald publicaram um documento com a seguinte declaração:
«Nós, ex-presos de Buchenwald, russos, franceses, polacos, checos, eslovacos, alemães espanhóis italianos, austríacos, belgas, holandeses, ingleses, luxemburgueses, romenos, jugoslavos e húngaros, lutámos em conjunto contra as SS e os criminosos nazis, para conseguir a nossa libertação. Animou-nos uma ideia: a nossa causa é justa – a vitória será nossa. Realizámos em muitas línguas a mesma luta, dura e cheia de vítimas. E esta lusa ainda não terminou …
Por esta razão nós juramos, perante todo o mundo, nesta praça de humilhação, neste lugar de crueldade fascista: somente paramos com a nossa luta quando o último culpado for apresentado perante os juízes dos povos!
Construir um mundo novo de paz e liberdade, ele o nosso objectivo!
É este o nosso dever perante as vítimas e os seus parentes.»
É muito semelhante a este o nosso compromisso de antifascistas portugueses. Tal compromisso está claramente expresso na Constituição da República Portuguesa, que, no seu Preâmbulo, declara «A Assembleia Constituinte afirma a decisão do povo português de defender a independência nacional, de garantir os direitos fundamentais dos cidadãos, de estabelecer os princípios basilares da democracia, de assegurar o primado do Estado de Direito democrático e de abrir caminho para uma sociedade socialista, no respeito da vontade do povo português, tendo em vista a construção de um país mais livre, mais justo e mais fraterno.»
No seu artigo 1º, a Constituição proclama: «Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na sua transformação numa sociedade sem classes.»
E, no seu artigo 2º, a Constituição determina: «A República Portuguesa é um Estado de direito democrático, baseado na soberania popular, no respeito e na garantia dos direitos e liberdades fundamentais e no pluralismo de expressão e organização política democráticas, que tem por objectivo assegurar a transição para o socialismo mediante a realização da democracia económica, social e cultural e o aprofundamento da democracia participativa.»
Pelo que respeita à política externa, a Constituição ordena, no artigo 7º, nº 2, que: «Portugal preconiza a abolição de todas as formas de imperialismo, colonialismo e agressão, o desarmamento geral, simultâneo e controlado, a dissolução dos blocos político-militares e o estabelecimento de um sistema de segurança colectiva, com vista à criação de uma ordem internacional capaz de assegurar a paz e a justiça nas relações entre os povos.»
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Estas transcrições da Constituição que acabo de vos ler e que, de certo modo, exprimem o nosso compromisso de antifascistas portugueses com o futuro, mostram, queridos Amigos, quanto o nosso compromisso com o futuro está longe de poder ser considerado como cumprido; mostram, queridos Amigos, que temos de continuar unidos e fortalecer e ampliar a nossa unidade até que sejam uma realidade as promessas e esperanças consignadas na Constituição.
Com efeito, é uma triste verdade que temos à frente dos destinos do País um governo reaccionário, um governo comprometido com a contra – revolução, um governo onde pontificam alguns membros de governos fascistas, um governo que, na sua acção diária, atenta contra a letra e o espírito da Constituição da República.
Age contra a letra e o espírito da Constituição, nomeadamente contra os direitos e liberdades dos cidadãos, quando pretende impor ao País uma lei dita de segurança interna, de índole nitidamente fascista, indigna, portanto, do Portugal de Abril.
Age contra a letra e espírito da Constituição, quando, em vez de abrir caminho para a sociedade socialista, o seu chefe declara com arrogância que meteu o socialismo na gaveta, alguns dos seus ministros declaram impunemente que empresas públicas devem ser desmanteladas, o governo, no seu conjunto, atenta contra as nacionalizações, mobiliza forças militarizadas contra a reforma agrária, arranca as terras das UCP’s para as entregar aos antigos latifundiários e ignora as decisões do Supremo Tribunal Administrativo, quando são favoráveis às UCP’s.
Age contra a letra e o espírito da Constituição, ofendendo os direitos e liberdades dos trabalhadores, quando toma ou defende medidas que equivalem a negar, aos trabalhadores, o direito ao trabalho e a instituir, para o grande patronato, o direito ao despedimento de trabalhadores; quando, não só fica inerte perante o crime social do não pagamento de salários a quem trabalha, como se opõe, por intermédio de uma maioria dócil na Assembleia da República, às iniciativas que têm sido tomadas por alguns deputados para resolver o problema dos salários em atraso ou para minorar algumas das suas consequências mais gravosas.
Age contra a letra e o espírito da Constituição, quando em vez de preconizar a abolição de todas as formas de imperialismo, o desarmamento geral, simultâneo e controlado, e a dissolução dos blocos político-militares , se compromete, cada vez mais, com o imperialismo, cedendo-lhe mais facilidades em território nacional, endividando o País, cada vez mais, com o armamento, sujeitando os trabalhadores portugueses às conveniências do imperialismo, fomentando a propaganda do bloco político-militar do Pacto do Atlântico, permitindo que, em território nacional, sejam tomadas medidas contrárias ao bom relacionamento com os governos de Angola e Moçambique.
Age ainda contra a letra e o espírito da Constituição, quando desconsidera, marginaliza e persegue alguns Capitães de Abril.
Pois bem; nós, que aqui viemos para prestar homenagem à Resistência Antifascista, jamais pactuaremos com os que conspiram ou agem contra a Revolução de Abril.
Jamais pactuaremos com os que, dizendo-se, embora, socialistas, conduzem a política mais ferozmente anti-socialista que até hoje foi seguida por qualquer governo após o 25 de Abril.
Jamais pactuaremos com quem pretende destruir as nacionalizações, com quem pretende desmantelar as empresas públicas, com quem pretende liquidar a reforma agrária.
Jamais pactuaremos com os que, na sua acção política, se tornaram delinquentes habituais contra a Constituição da República.
Por isso, de braços abertos a todos os resistentes antifascistas, defendemos a demissão, quanto antes, do governo que aí está e defendemos a responsabilização dos seus membros pelos delitos que tenham praticado contra os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, contra a independência nacional e contra a economia nacional.
Defendemos a dissolução da Assembleia da República e a consequente realização de eleições legislativas antecipadas.
Defendemos a formação de um governo de unidade antifascista que dê garantias de respeitar a Constituição da República.
Só apoiaremos a candidatura à Presidência da República de alguém com credibilidade política que dê garantias de respeitar e continuar Abril.
VIVA O 25 DE ABRIL! VIVAM OS CAPITÃES DE ABRIL!
25 DE ABRIL SEMPRE! FASCISMO NUNCA MAIS!
José Morgado,
Porto, junto à antiga sede da pide,
25 de Abril de 1985
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