Porto, 19 de Janeiro de 1982
Prezado Professor Abílio Fernandes
Só agora me é possível responder à sua carta de 11 deste mês, em que me pedia uma nota sumária das principais realizações do Professor Ruy Luís Gomes, na Reitoria da Universidade do Porto. Espero que a minha demora em responder à sua amável carta não lhe tenha causado qualquer transtorno. Desculpe.
1) Quando o Professor Ruy Luís Gomes assumiu as funções de Reitor, a Reitoria estava instalada numa pequena dependência da Faculdade de Ciências, faculdade que havia sido atingida por um incêndio, pouco dias antes do 25 de Abril.
Assim, houve que tomar, logo de início, providências para que as obras de restauro e ampliação da Faculdade de Ciências fossem começadas quanto antes. Houve também que arranjar instalações de emergência para outros cursos e Escolas da Universidade.
Conseguiu que o Senhor Bispo do Porto cedesse gratuitamente, por empréstimo, um seminário – o Seminário de Vilar – para instalação do Curso de História (foi precisamente neste seminário que começaram as actividades do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar).
Conseguiu que se comprassem os edifícios do Colégio Almeida Garrett, para instalação dos primeiros anos da Faculdade de Engenharia.
Iniciaram-se as obras de construção de um edifício para a instalação da faculdade de Letras.
2) Diligências feitas junto do Ministro V. Magalhães Godinho em 1974 tiveram como resultado a nomeação de uma Comissão (de que fizeram parte Ruy Luís Gomes, Corino de Andrade, Nuno Grande, Neves Real) para apresentarem um projecto de criação do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar.
O decreto-lei que criou o ICBAS data de 19 – 8- 75, sendo então Ministro da Educação o major José Emílio da Silva.
Em 16-10-75, tomou posse a Comissão Instaladora do ICBAS, constituída por:
- Ruy Luís Gomes (reitor, presidente);
- Corino de Andrade (neuropatologista, director dos Serviços de Neurologia do Hospital Geral de Santo António);
- Aloísio Coelho (subdirector do Instituto Nacional de Saúde Ricardo Jorge e Professor da Escola de Saúde Pública);
- Pereira Guedes (?) (chefe dos Serviços de Análise do Hospital Geral de Santo António)
- Neves Real (matemático, professor da Faculdades de Ciências);
- Nuno Grande (professor catedrático da Universidade de Angola; actual Presidente do Conselho Directivo)
- João Monjardino (?) (Sénior Investigador da Escola Médica do Royal Free Hospital de Londres)
Foi o Secretário de Estado António Brotas que se deslocou ao Porto para dar posse à Comissão; era então Ministro da Educação o major Vítor Alves.
O ICBAS corresponde a um projecto de formação, não de apenas mais uma Faculdade de Medicina, mas de um Instituto de Biologia Aplicada.
Para isso, o Prof. Ruy Luís Gomes procurou reunir investigadores portugueses de grande mérito residentes no País ou no estrangeiro, tais como, Alexandre Quintanilha, Arala Chaves, Lima de Faria, Ângela de Sousa, Teles Grilo.
Actualmente o ICBAS compreende a licenciatura em Medicina (em colaboração com o Hospital G. de Santo António, para o ciclo clínico), a licenciatura em Ciências do Meio Aquático (em colaboração com várias escolas, especialmente da Universidade do Porto) e colabora na licenciatura em Bioquímica da Faculdade de Ciências do Porto.
Quanto ao espírito que animou a criação do ICBAS, julgo serem elucidativas algumas palestras realizadas há já quase 40 anos, por Ruy Luís Gomes, Corino de Andrade e António Aniceto Monteiro.
Tomo a liberdade de lhe enviar uma cópia destas palestras.
Não foi nada fácil firmar a criação do ICBAS; basta dizer-lhe que o Ministro Cardia chegou a ter pronto para publicação o decreto de extinção do ICBAS! ...
3) A preocupação de reunir, na Universidade, investigadores de alto mérito foi sempre uma preocupação do Professor Ruy Luís Gomes.
Assim foram chamadas, entre outros, para trabalhar na Universidade do Porto, e vieram para esta Universidade,
Hugo Baptista Ribeiro (matemático)
Armando de Castro (economista)
Óscar Lopes (escritor e especialista em linguística)
Ricardo Lima (matemático)
Muitos outros, que foram chamados, não puderem vir (por motivo de impossibilidades pessoais ou por falta de colaboração de organismos universitários), tais como,
António Aniceto Monteiro (matemático)
António Barros Machado (biólogo)
Manuel de Oliveira (cineasta)
4) Após o falecimento de Abel Salazar em 29 de Dezembro de 1946, um grupo de amigos e admiradores pensou criar uma Fundação Abel Salazar, com o objectivo de organizar a CASA MUSEU ABEL SALAZAR.
Houve naturalmente muitas dificuldades. Os estatutos não foram oficialmente aprovados…
Quando Ruy Luís Gomes estava no Brasil (em 3-6-63) foi criada uma Cooperativa “Sociedade Divulgadora da Casa Museu Abel Salazar”, que tem como primeiro objectivo, nos seus Estatutos, a Criação da Casa Museu Abel Salazar. Entrou em contacto com Fundação Gulbenkian para financiar a restauração da Casa e aquisição das obras de Abel Salazar, o que foi conseguido.
Em 31-5-75, a Fundação Gulbenkian fez a doação da Casa Museu à Universidade do Porto – após a restauração da Casa e construção, no terreno anexo, de um pavilhão para exposições.
É nesse pavilhão que se encontra a colecção que pertenceu à irmã de Abel Salazar e que foi comprada pela Gulbenkian.
Embora situada nos arredores do Porto, em S. Mamede de Infesta, a Casa Museu começa de facto a ser conhecida e visitada por apreciável número de pessoas. Assim, em 1981, o número de visitantes ultrapassou os 1500.
5) Foi ainda o reitorado do Professor Ruy Luís Gomes (que não chegou a ano e meio), que foi doada à Universidade uma importante Biblioteca, pelo Dr. Pedro Veiga. A esta Biblioteca foi naturalmente dado o nome de “Biblioteca Pedro Veiga”. Compreende mais de 60 000 mil volumes, dos mais variados domínios do saber e pode vir a ser um centro importantíssimo de actividades culturais muito interessante.
Meu Ex.mo Amigo
Creio que ficam aqui reunidas as principais actividades do Professor Ruy Luís Gomes, durante o seu curto reitorado.
Se em mais alguma coisa lhe puder ser útil, queira dispor do
José Morgado